EAP Index Brasil: 10 a 13 de Março de 1975: A última Sessão de Estúdio

quarta-feira, 12 de março de 2025

10 a 13 de Março de 1975: A última Sessão de Estúdio


RCA Studio C; Hollywood, 1975


No início de 1975, a carreira de Elvis havia chegado a um ponto de estagnação: Os shows de 1974, embora tivessem boa qualidade, apresentavam um cantor cansado da rotina e de seus problemas pessoais, o que frequentemente acabava gerando episódios de desabafos e explosões de raiva em cima do palco. Desapontado com a traição do Coronel, que vendera todos os direitos das músicas de 1956-73 para a RCA, e com as músicas oferecidas pela Hill & Range, ele tinha cada vez menos vontade de entrar em estúdio e, de fato, naquele ponto, já não o fazia há mais de um ano. 

O "Aloha from Hawaii" fora um grande hit, mas já havia acontecido há dois anos. O único LP com músicas inéditas em 1974, "Good Times", havia sido lançado há 10 meses e "Recorded Live On Stage in Memphis" fora produzido tão às pressas e tão mal editado que falhou em ser o grande álbum ao vivo daquele ano quando chegou às lojas em julho. Aparte destes, todos os outros lançamentos de 1974 apenas compilavam sucessos do passado sem a percepção de que o nome de Elvis estava perdendo espaço no novo mercado enquanto a gravadora lucrava.

Foi o lançamento de "Promised Land", exatamente no dia do 40º aniversário de Elvis, que acendeu a luz vermelha na RCA. A gravadora comemorou o bom desempenho do álbum em comparação com os do ano anterior, mas não deixou de notar que, para seguir com resultados positivos, precisaria de novos lançamentos com material inédito. O problema então era como fazê-lo, uma vez que "Promised Land" trazia as últimas faixas inéditas de estúdio, gravadas ainda em 1973.


Havia, no entanto, problemas maiores: Como colocar Elvis dentro de um estúdio era o principal. O Rei do Rock havia proclamado em dezembro de 1973, após as últimas sessões de gravação no Stax Studio em Memphis, que faria o que fosse possível para não entrar em estúdio novamente se a qualidade das músicas não melhorasse e se seus requisitos não fossem atendidos. O simples fato de que ele passara 1974 sem se aproximar de uma sessão de gravação provava o quanto séria era esta afirmação.

Outro problema era o estado de saúde de Elvis. Depois dos episódios de explosões de raiva no palco em 1974, era notável que o cantor estava passando por problemas em diversos setores. Alguns diziam que a combinação de remédios usados para evitar as dores terríveis que sentia causava as alterações no humor; outros afirmava que era o consumo exagerado dos mesmos, sem necessidade, que o deixava daquele jeito. Havia ainda quem dissesse que nada tinha a ver com remédios, mas sim com a insatisfação com o andar de sua vida e carreira. Fosse o que fosse, aquilo tudo atrapalhava o andamento das coisas.

Como de costume, Elvis estava escalado para começar a primeira temporada de Las Vegas em 1975 em 26 de janeiro. Apesar disso, ele vinha reclamando de dores e outros problemas desde o início do mês e manifestava abertamente a falta de vontade de se apresentar. Ocorrências médicas mais graves acabaram por colocar Elvis no hospital em 29 de janeiro de 1975 por problemas relacionados ao fígado e ao uso exagerado de medicamentos. Anos mais tarde, descobriríamos que o cantor foi fazer uma desintoxicação de emergência após quase sofrer uma overdose de remédios controlados.


Com o início da temporada de Las Vegas adiado para 18 de março de 1975, Elvis ficou em repouso no Baptist Memorial. Para piorar as coisas, Vernon deu entrada no mesmo hospital em 5 de fevereiro, após sofrer um infarto. Segundo consta, ele estava muito tenso com a situação do filho (o uso de remédios de forma descontrolada) e isso agravou problemas cardíacos de família (também herdados por Elvis). Ambos se recuperaram juntos no mesmo quarto, mas não sem Vernon ter a conversa mais franca de sua vida com Elvis, afirmando que Gladys havia morrido de preocupação com as atitudes do filho.

Problemas familiares aparte, a RCA esperou que Elvis saísse do hospital em 14 de fevereiro para indagar sobre novas gravações. O cantor não estava nada entusiasmado com a possibilidade de entrar em um estúdio, mas tinha a obrigação contratual de fazê-lo e o bafo quente do Coronel em sua nuca. Ele até tentou se esconder em sua casa em Malibu, mas a gravadora tinha uma carta na manga: o RCA Studio C em Hollywood.

Localizado a uma hora de carro de sua casa em Malibu, o Studio C não era novidade para Elvis, que gravava faixas ali desde 1960. Da trilha de "G.I.Blues" aos overdubs de álbums consagrados como "From Elvis in Memphis", "Elvis Sings the Wonderful World of Christmas", "Raised On Rock", "Good Times"  e "Promised Land", o estúdio tinha sido parte de sua carreira há muito tempo. Embora relutante, Elvis acabou aceitando a proposta da RCA após perceber que aquele seria um bom momento para fazer suas exigências. Entre elas, estava a de que escolheria apenas músicas que fossem de seu gosto pessoal, com músicos que fossem de sua confiança e no horário que mais lhe conviesse. Sem muito espaço para barganhar, a gravadora acabou por ceder.


Elvis chegou ao Studio C por volta das nove da noite de 10 de março de 1975.
 Como de costume, ele fez questão de cumprimentar e conversar com todos que lhe auxiliariam naquele trabalho antes de começar a gravar faixas. Risos, bebidas e petiscos foram o foco até próximo das 11 da noite, quando o cantor decidiu tentar alguns takes de "Fairytale". O sucesso das Pointer Sisters era uma das músicas preferidas de Elvis na época, o que se mostrou nesta rápida sessão que alcançou o Master com apenas três tomadas.

Como de praxe, já era madrugada de 11 de março quando Elvis finalmente engrenou e começou a produzir em massa. A segunda música da sessão foi o sucesso de Tom Jones em 1966, "Green Green Grass of Home", outra muito interpretada pelo cantor em seus momentos de descanso em Graceland. Após cinco takes, o Master tinha sido alcançado e era hora de partir para o clássico "I Can Help" de Billy Swan. Esta sofreu um pouco por não estar entre as mais adoradas por Elvis, mas ele fez um ótimo trabalho nas duas tomadas que gravou.

Passava de quatro da manhã quando Elvis decidiu que tentaria gravar "And I Love You So". O sucesso de Don McLean em 1970, regravado por Perry Como em 1973,  era a canção mais intimista do dia, e Elvis precisava de todo seu sentimento para fazer um bom trabalho. Para isso, ele chamou Sheila Ryan, sua namorada enquanto Linda Thompson estava "de castigo", e cantou o primeiro take diretamente para ela. O Master, no entanto, só seria registrado na quinta tomada, próximo das sete da manhã, a qual também encerraria a sessão.


Às 9 da noite de 11 de março de 1975, lá estavam Elvis e seus músicos novamente reunidos no Studio C para mais uma sessão. Escrita por Don Reid, do grupo Gospel The Statler Brothers,  "Susan When She Tried" foi a primeira seleção da noite e foi extensamente trabalhada em seis takes. A madrugada chegou com Elvis fazendo quatro tomadas de "T.R.O.U.B.L.E." e se divertindo com uma jam session ao som de "Tiger Man".

Depois de um breve intervalo para comes e bebes, a sessão foi retomada às 4 da manhã do dia 12. Revigorado, Elvis fez um excelente take de "Woman Without Love" que acabou por tornar-se o Master imediatamente. O final da sessão foi todo dedicado ao sucesso de Faye Adams em 1953, "Shake a Hand", em três tomadas muito bem trabalhadas.

A última sessão de estúdio da carreira de Elvis ocorreu entre a noite do dia 12 e a madrugada de 13 de março de 1975. Escrita por Gregg Gordon especialmente para o Rei do Rock, "Bringin' it Back" refletia quase que totalmente o momento da vida do cantor, que fez uma interpretação magistral em quatro takes magníficos. Já próximo das 3 da manhã, Elvis pôs sua voz em outras quatro tomadas fenomenais de "Pieces of My Life", sucesso de Charlie Rich no ano anterior.


Os resultados das sessões de março de 1975 no Studio C da RCA em Hollywood seriam todos lançados no LP "Today", em 7 de maio daquele ano. Pela primeira vez na carreira de Elvis, a gravadora se via sem nenhuma possibilidade de erro ou de lançamentos parciais, uma vez que não havia sobras de sessões anteriores para tais aventuras. Somente "T.R.O.U.B.L.E.", a única música rock do álbum, foi lançada como single promocional em abril de 1975, com "Mr. Songman", do LP "Promised Land", no lado B, mas o compacto não teve o sucesso esperado.

Sem absolutamente nenhum material novo disponível e sem chances de Elvis aceitar participar de novas sessões de gravação, a RCA se viu obrigada a atravessar o ano de 1975 fazendo lançamentos de compilações de sucessos do passado e singles do material dos álbuns daquele ano. Elvis, descontente com os rumos de sua vida e carreira, somente aceitaria gravar novas faixas em fevereiro de 1976, no aconchego de sua Jungle Room em Graceland., fazendo com que os três dias em março de 1975 fossem os últimos a ver o Rei do Rock em estúdio.

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